A “America” contactou todas as dioceses dos EUA para saber dos seus planos sinodais. Eis o que encontrou.

No mês passado, uma equipa de jornalistas da “America Media” contactou todas as 196 “igrejas particulares” nos Estados Unidos – dioceses, eparquias e o Ordinariato Pessoal da Cátedra de São Pedro – e foi capaz de confirmar a nomeação de 62 coordenadores locais do sínodo.

A fase diocesana do processo sinodal global, oficialmente intitulada “Rumo a uma Igreja Sinodal: Comunhão, Participação, Missão”, começou no Domingo, 17 de Outubro, mas apenas cerca de metade das dioceses dos Estados Unidos deram o primeiro passo para nomear um coordenador  local do Sínodo, conforme exigido pelas instruções do Vaticano.

No mês passado, uma equipa de jornalistas da America Media contactou todas as 196 “igrejas particulares” nos Estados Unidos – dioceses, eparquias e o Ordinariato Pessoal da Cátedra de São Pedro – e foi capaz de confirmar a nomeação de 62 coordenadores locais do Sínodo. Richard Coll, o director executivo do Departamento de Justiça, Paz e Desenvolvimento Humano da Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos, que é o elemento de ligação da Conferência com esses coordenadores, disse que, com muitas nomeações feitas poucos dias antes do Sínodo, esse número era à volta de 80 na abertura da fase diocesana, representando cerca de metade das 176 dioceses dos Estados Unidos.

O Sínodo, apelidado de “Sínodo sobre sinodalidade”, visa mudar a igreja para um modelo mais descentralizado de tomada de decisão, convidando leigos e aqueles que tradicionalmente não têm voz na liderança da Igreja a discussões sobre como ser uma Igreja mais inclusiva e colaborativa. O processo de três etapas inclui uma fase diocesana, que vai de Outubro de 2021 a Abril de 2022; uma fase continental, abrangendo o final de 2022 e o início de 2023, e uma fase final universal, que será uma reunião de bispos e outras pessoas em Roma, em Outubro de 2023. Embora o Sínodo provavelmente não origine uma transformação em grande escala das estruturas da Igreja, o Papa Francisco vê-o como um primeiro passo necessário.

Das 196 igrejas contactadas pela America Media no mês passado, 105 não responderam. (Entre estas estavam três igrejas que foram contactadas no final do processo. Este artigo será actualizado para reflectir as suas respostas.) Das 91 que o fizeram, a grande maioria planeou uma missa de abertura, cerca de dois terços nomearam um coordenador local, e 35 tinham um plano para chegar às paróquias e obter feedback. Apesar das instruções do Vaticano de que “um cuidado especial deve ser tido para envolver as pessoas que podem correr o risco de serem excluídas: mulheres, pessoas com deficiência, refugiados, migrantes, idosos, pessoas que vivem na pobreza, católicos que raramente ou nunca praticam a sua fé, etc.”, apenas umas quantas igrejas descreveram planos para atingir especificamente esses grupos.

Desafios

Apesar de os bispos dos Estados Unidos terem sido, no geral, mais lentos a abraçar o modelo sinodal do que os bispos da Irlanda, Alemanha, Austrália, América Latina e Caribe, por exemplo, os atrasos neste processo específico não podem ser atribuídos inteiramente à falta de abertura à sinodalidade, advertiu Coll, da Conferência Episcopal dos Estados Unidos (USCCB).

As dioceses nos Estados Unidos enfrentam uma série de desafios na implementação do processo, incluindo tempo inadequado para se prepararem, falta de recursos informativos e financeiros e a pandemia de coronavírus em curso, questões que não são exclusivas destas dioceses.

A Secretaria do Sínodo divulgou os seus dois documentos principais – o Documento Preparatório e o Vademecum, ou manual, para as dioceses – apenas a 7 de Setembro, o que, segundo algumas dioceses, não lhes deu tempo suficiente para se prepararem para a data de lançamento a 17 de Outubro. Outras dioceses que tinham planos mais concretos até ao dia 17 começaram o planeamento antes mesmo da distribuição dos documentos do Vaticano, como nas dioceses de Bridgeport, Connecticut e Gary, Indiana.

A outras dioceses, como a Diocese de Rockford, Illinois, preocupa-as que o risco de contrair Covid-19 possa impedir que alguns constituintes participem das sessões de escuta. Para alcançar aqueles que ficam em casa, a diocese de Rockford planeia recolher respostas pessoalmente e online.

A pandemia também retardou o processo de planeamento das dioceses, disse Coll.

“Acho que, dada a pandemia e os vários graus de regresso aos escritórios diocesanos, provavelmente está a ser um pouco menos eficiente do que poderia ser.” Coll espera que a página de recursos do Sínodo da USCCB, publicada na segunda-feira, 18 de Outubro, ajude as dioceses que estão com dificuldades em fazer planos.

Finalmente, cerca de 40% das dioceses dos EUA são consideradas dioceses de “missão”, o que significa que cobrem uma grande área, têm poucos católicos ou enfrentam dificuldades financeiras. As eparquias católicas orientais enfrentam muitos desses desafios. Por causa das grandes distâncias e recursos escassos, o planeamento de sessões para alcançar o maior número de pessoas possível tem sido particularmente difícil. Um porta-voz de uma dessas dioceses, a arquidiocese de Anchorage-Juneau, no Alasca, disse à America que não poderia fornecer nenhuma informação sobre os planos do Sínodo.

Coll, que anteriormente trabalhou no ramo das Missões Domésticas Católicas da Conferência Episcopal dos EUA, que financia as dioceses missionárias, disse que queria dar prioridade ao apoio dos esforços sinodais dessas dioceses. Em particular, espera apoiar as eparquias, que, como outras igrejas orientais, usam o modelo sinodal há séculos, apesar de se ter tornado um foco de igrejas de Rito Romano apenas depois do Concílio Vaticano II.

“Elas têm, é claro, um dom especial porque, como diriam, tiveram sempre uma tradição mais sinodal em termos de como abordam as suas decisões como membros de comunidades de rito oriental”, disse Coll. “Mas também enfrentam problemas financeiros porque, novamente, como grandes territórios, nem tantos fiéis fazem parte das eparquias… Portanto, obter os benefícios dos seus dons e, ao mesmo tempo, apoiá-los de forma prática, acho que será muito valioso e importante”, acrescentou.

Preparativos

Apesar dos desafios logísticos que muitas dioceses nos Estados Unidos enfrentaram, várias dioceses que a America procurou indicaram que estavam bem preparadas.

Na Diocese de Gary, Indiana, o bispo Robert J. McClory disse numa entrevista telefónica que a sua diocese decidiu começar a preparar-se para o Sínodo assim que o Vaticano anunciou os seus planos em Maio de 2021. Meses antes do início do Sínodo, a diocese manteve encontros com os padres da diocese e com o conselho pastoral diocesano. As dificuldades logísticas deste processo foram atenuadas pelo facto de a Diocese de Gary ter realizado o seu próprio Sínodo local em 2017. Na mesma altura desse Sínodo, o Bispo McClory estava envolvido na coordenação de outro Sínodo na Arquidiocese de Detroit, onde havia servido como Vigário Geral antes de ser ordenado bispo de Gary.

Da mesma forma, a Diocese de Bridgeport, Connecticut, iniciou o processo durante o Verão. No fim de Agosto, o bispo Frank Caggianno enviou uma carta aos pastores da diocese explicando os objectivos do Sínodo e instruiu as paróquias a escolherem os delegados sinodais até 15 de Setembro, um mês antes da missa de abertura do Sínodo.

Em Gary e em várias outras dioceses, incluindo a Corpus Christi, Texas, Marquette, no Michigan, Phoenix, no Arizona, e Reno, em Nevada, os líderes do processo sinodal têm planos para alcançar, de acordo com as recomendações do Vaticano, uma série de grupos que tradicionalmente são deixados de fora das discussões da Igreja. Em Gary, a diocese conduzirá discussões com jovens, idosos e populações interculturais, fazendo-o em grupos de apenas sete pessoas a cada vez para encorajar discussões francas.

Enquanto isso, o Rev. Timothy Ekaitis, que actua como coordenador sinodal na Diocese de Marquette, Michigan, disse num e-mail que a sua diocese está a esforçar-se por envolver membros de tribos indígenas americanas, cristãos de outras denominações e católicos de rito oriental. Em Phoenix, os organizadores sinodais estão empenhados em incluir perspectivas de pessoas sem-abrigo e pessoas que já não praticam a fé católica.

Claro, uma coisa é aspirar a incluir pessoas de origens diversas e outra é fazê-lo, especialmente quando uma determinada diocese inclui pessoas que falam diferentes línguas e vêm de culturas diferentes. As dioceses que estão mais bem preparadas para o Sínodo têm-se esforçado para enfrentar esse desafio, assumindo a tarefa de alcançar um grupo representativo de pessoas através de estratégias que se assemelham a campanhas de voto antes das eleições nacionais.

Na Diocese de Santo Agostinho, Flórida, os coordenadores enviam postais para as casas católicas, realizam uma campanha nas redes sociais e distribuem folhetos promocionais em sete línguas diferentes. Além disso, os delegados de cada paróquia foram instruídos a encorajar outros paroquianos a envolverem-se no Sínodo. A diocese planeia designar pessoas de diferentes culturas para liderar alguns dos seus grupos de escuta, de forma a que todos os participantes se sintam confortáveis.

Alguns Estados mais a Oeste, no Texas, a Arquidiocese de San Antonio enviou um anúncio brilhante e multicolorido a explicar o propósito do Sínodo e a descrever em detalhe como é que as pessoas dentro da arquidiocese se poderiam envolver. Foram impressos em inglês e espanhol para alcançar o maior número possível de pessoas numa área com uma grande população latina.

Aprendizagens

As apostas estão altas. Embora os Papas tenham convocado o Sínodo dos Bispos desde a conclusão do Concílio Vaticano II (30 vezes desde 1967), talvez nenhuma outra reunião sinodal tenha tido tanto potencial para mudar as estruturas da Igreja, ou pelo menos a imagem que a Igreja tem de si mesma, mudando de um modelo que identifica principalmente a Igreja com a hierarquia para uma visão da igreja como o “povo de Deus”, uma forte ênfase do Vaticano II. O Papa Francisco fez da implementação do Concílio um dos principais objectivos do seu pontificado, e o “Sínodo sobre a sinodalidade” poderia moldar significativamente o seu legado.

O que continua em questão é o efeito que o Sínodo terá na Igreja dos Estados Unidos e se uma comunidade católica e um episcopado dividido em linhas políticas serão capazes de se reunir para discussões abertas que certamente tocarão em questões polémicas que dividiram a Igreja americana ao longo de décadas. O Papa acredita fortemente no poder transformador do encontro e da escuta entre as pessoas que discordam, mas alertou com razão para os Sínodos se poderem tornar “parlamentos”. Sem um compromisso de escuta, humildade e caridade, essas discussões sinodais correm o risco de traçar linhas de batalha cada vez mais profundas numa Igreja Católica dos EUA já dividida.

Outro risco é a inclusão. Muitas das dioceses contactadas pela America não relataram nenhum plano para irem além das paróquias, e os grupos de discussão paroquiais provavelmente irão atrair apenas aqueles que já estão mais envolvidos na paróquia. Embora essas vozes sejam certamente importantes, o Vaticano sublinhou a possibilidade de alcançar aqueles que estão à margem da Igreja ou fora dela.

“Acho que se o Sínodo fosse limitado a algumas vozes tradicionais, por mais importantes que sejam, não daria bom resultado, porque estaríamos a excluir exactamente o tipo de vozes que são mais cruciais para o processo sinodal”, disse Coll. O responsável afirmou que irá medir o sucesso do processo “pela duração e amplitude do diálogo e pela inclusão de comunidades e grupos de indivíduos que têm percepções múltiplas, divergentes e distintas sobre como a Igreja Católica pode ser uma igreja mais sinodal, tanto em termos do seu funcionamento interno, bem como na sua relação com o mundo mais amplo”.

Para esse fim, está a contactar organizações católicas que chegam a pessoas marginalizadas, como a Catholic Charities e a Catholic Relief Services. Quando questionado sobre que conselho daria a indivíduos que queiram participar do processo, mas não receberam informações das suas dioceses, Coll sugeriu entrar em contacto com a diocese e enviar feedback para o seu gabinete através do site da USCCB.

Talvez o maior desafio que os bispos norte-americanos enfrentam neste processo seja o objectivo final do próprio processo: aumentar a colaboração e descentralizar o poder. O Sínodo procura mover a Igreja de um modelo puramente de pregação para um que escuta, se envolve no diálogo e discerne juntamente com uma variedade de pessoas. Esta seria uma mudança significativa para vários bispos americanos.

Existem alguns sinais de esperança. Embora os bispos dos EUA não se tenham dedicado ao Sínodo na sua reunião de Junho – a última reunião antes do início do processo – planeiam discuti-lo por 45 minutos na reunião de Novembro, disse Coll. O responsável acredita que à medida que mais dioceses forem iniciando os seus processos, outras seguirão o mesmo exemplo

Aqueles que já participaram anteriormente em Sínodos, como o bispo McClory de Gary, Indiana, também sublinham que o próprio processo sinodal pode ser transformador.

O bispo McClory acredita que este Sínodo “contém muitas promessas”, mesmo que a tarefa seja um tanto ou quanto assustadora. “Tenho experimentado, directa e indirectamente, a vitalidade que os Sínodos podem levar a uma igreja local”, disse.

O bispo McClory afirmou que, quando perguntou aos membros da sua diocese quando é que achavam que a diocese tinha estado no seu melhor, responderam que tinha sido durante o Sínodo diocesano de 2017. “Aquela experiência sinodal foi realmente um momento de grande alegria para eles. Quero continuar a caminhar a partir disso”, concluiu.

Artigo de Colleen Dulle e Doug Girardot, publicado em America, The Jesuit Review, a 18 de Outubro de 2021.

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